O problema da habitação nas eleições legislativas


A campanha nacional da Coligação Democrática Unitária (CDU) encerrou hoje, com acções com a participação do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, na cidade da Maia, no Porto, onde decorreu um impressionante desfile, e em Braga. Na Maia, coube-me fazer a intervenção que transcrevo a seguir:

Camaradas e amigos,

Uma calorosa e fraterna saudação a esta magnífica jornada de afirmação e de luta pelos valores de Abril e por um projecto de transformação no qual convergem militantes e amigos do PCP e do PEV, assim como muitos independentes, que aspiram a mudanças decisivas na vida dos trabalhadores e do povo, e por elas se batem.

Permitam que vos fale da urgência da mudança numa área fundamental na vida de milhões de portugueses – o direito à habitação.

Dentro de um mês, passa um ano sobre a aprovação de um acordo entre o Município da Maia e o Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), com vista ao realojamento de 757 famílias em seis anos, volume com que a Câmara PSD/CDS embandeirou em arco.

Desses fogos, apenas 31 têm para já empréstimo autorizado pelo IHRU para reabilitação, um investimento para realizar, não em quatro ou cinco meses, mas, pasme-se!, em quatro ou cinco anos!

Os 757 fogos prometidos são apenas uma parte das reais necessidades no concelho, muito superiores a duas mil, tendo em conta que o levantamento nacional feito em 2017 já indicava 794 famílias a viver em condições indignas; que a própria empresa Espaço Municipal referiu, em 2020, 1930 pedidos de habitações pendentes; e que relatórios técnicos para operações de reabilitação urbana têm referido a existência de núcleos de habitação abarracada ou degradada que não são objecto de pedido de habitação.

Mesmo considerando os 794 fogos referidos no levantamento do IHRU, a Maia era então o terceiro concelho com maior carência na Área Metropolitana do Porto, atrás do Porto (2 091 habitações) e de Vila Nova de Gaia (824).

 

O Programa Nacional de Habitação e o programa eleitoral do Partido Socialista prometem para todo o país 26 mil novos fogos para habitação pública até 2026, isto é, dentro de apenas quatro anos, bem como 6 800 fogos do programa de renda acessível.

A verdade é que tal volume está muito aquém dos 31 526 identificados, em 187 municípios, em 2017, como fogos sem condições mínimas de habitabilidade. Assim como os 6 800 prometidos para a renda acessível estão muito longe das necessidades: só o Município de Lisboa fala em sete mil.

A verdade é que, como o PCP tem afirmado, são necessárias com urgência pelo menos mais 50 mil casas para outras tantas famílias que vivem em condições indignas.

Assim como são necessárias milhares e milhares de habitações para famílias, especialmente jovens, esmagadas pela espiral de especulação imobiliária e dos aumentos galopantes das rendas e dos preços para aquisição.

Só entre Setembro de 2020 e Setembro de 2021, aumentaram pelo menos 11%, ou mesmo muito mais nalgumas zonas. Há inúmeras famílias a pagar 600 euros mensais ou mnais por um T1 ou um T2.

Apesar dos compromissos do governo cessante e das promessas do PS, há fundadas dúvidas sobre a real capacidade – ou mesmo a vontade – de concretização de qualquer plano sério de construção ou reabilitação de imóveis para habitação pública.

Em dez anos, entre 2011 e 2020, foram concluídas apenas 1500 novas habitações familiares de promoção pública. Entre 2016 e 2020, isto é, nos cinco anos estatisticamente mais recentes, o volume de nova habitação pública foi de somente 203 fogos.

 

A insuficiência de investimento em habitação pública é bem o corolário dos compromissos das sucessivas políticas de direita, que preferem canalizar importantíssimos recursos financeiros para os grandes interesses da banca, em vez de os investir onde é mais necessário.

Entre 1987 e 2011, o Estado entregou aos bancos, a título de bonificações de juros sobre crédito à habitação, mas na verdade como alavanca para o ressurgimento, implantação e consolidação da banca privada, mais de sete mil milhões de euros, correspondentes a mais de 73% do investimento público no sector.

Foram principalmente os governos do PSD (e PSD/CDS), mas também do PS, que permitiram à banca engordar, subtraindo o financiamento às cooperativas de habitação, forçadas a condições de crédito incomportáveis e empurrando as famílias para os braços dos bancos, os verdadeiros donos das casas de milhões de portugueses.

Não admira que a promoção de habitação cooperativa tenha definhado a tal ponto que há uma década não tem sequer expressão estatística. Em 2012, foram concluídos apenas 84 fogos cooperativos, entre um total de mais de 34 mil novas habitações familiares. De então para cá, a origem cooperativa nem sequer é indicada.

 

Se o PS promete muito, mas mesmo assim de forma muito insuficiente face às gravíssimas carências, não tenhamos qualquer ilusão sobre o que propõe o PSD, cuja única obsessão quanto à habitação pública é que esta se “pague a si própria”, portanto sem qualquer preocupação social, emancipadora e integradora.

Assim como também não restam dúvidas quanto ao que pensam os sucedâneos do PSD, que não dedicam uma única linha dos respectivos programas à habitação pública.

O PCP e a CDU, pelo contrário, confirmando o seu profundo conhecimento das necessidades e anseios das populações, e honrando o seu indeclinável compromisso de dar-lhes resposta concreta, apresentam um conjunto decisivo de propostas, com vista a assegurar habitação adequada a todos, económica e fisicamente acessível e eficiente.

De entre elas, destacam-se:

- Dotar a Administração Central dos instrumentos e meios necessários para o desenvolvimento de políticas de habitação de âmbito e responsabilidade nacional.

- Mobilizar o património habitacional público para programas de renda apoiada ou de renda condicionada e combater a especulação, com a recuperação de prédios devolutos, recolocando-os na oferta de habitação.

- Revogar a Lei do Regime de Arrendamento Urbano e adoptar um quadro legal que combata a especulação, regule preços e assegure estabilidade nos contratos de arrendamento por um período mínimo de dez anos.  

- Alargar a oferta pública de habitação em mais 50 mil fogos.

- Mobilizar recursos para habitação a custos controlados e apoiar a revitalização do movimento cooperativo e de organizações de moradores e inquilinos, na auto-construção e na reabilitação.  

- Estabelecer na legislação sobre renda apoiada o critério do rendimento líquido e não do rendimento bruto para a fixação do seu valor.

- Reforçar o apoio ao Arrendamento Jovem com o aumento da verba do Orçamento do Estado.

- Lançar um Programa de Recuperação do Parque Habitacional Público.

- Impedir a penhora e execução da hipoteca sobre a habitação para pagamento de dívidas irrisórias ou em condições de favor à banca.

 

Camaradas e amigos,

Ao aproximar-se das eleições de depois de amanhã, a CDU reafirma-se, também no que diz respeito à habitação, como força com propostas que contam para mudar a vida de largos milhares de famílias, para responder aos anseios e necessidades das populações.

Nas horas que faltam, saibamos transformar a esperança em decisão, e a convicção em voto.

Porque há um voto que decide – é o voto na CDU!

 

Viva a CDU!


(A foto foi retirada, com a devida vénia, da página da CDU - Distrito do Porto)


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