Em defesa do jornalista Bruno Amaral de Carvalho

Prossegue em ritmo feroz a campanha de perseguição ao jornalista Bruno Amaral de Carvalho, o único repórter português que ousou ir observar a guerra na Ucrânia num território que mais nenhum camarada nacional seu quis ou pôde cobrir.

Fá-lo num teatro de operações de elevado risco, do outro lado da linha da frente. Fá-lo, sobretudo, porque leva às últimas consequências o que sente ser seu dever de contribuir para que o público disponha de informação o mais completa possível.

Por isso, Bruno Amaral de Carvalho atua em cenários atacados por forças ucranianas, do mesmo modo que os outros, a maioria, trabalham em cenários atacadas por forças russas e separatistas. É esse o seu arriscado contributo para o pluralismo.

Deveríamos todos agradecer a enorme coragem do Bruno, que se lançou sozinho numa missão muito arriscada, em zonas de combate, e sem qualquer suporte – laboral, material, financeiro, logístico e até moral – de qualquer órgão de informação: apenas vendendo a quem aceita os trabalhos que vai fazendo.

Se estivesse noutro local, num “outro lado” da guerra, o Bruno Amaral de Carvalho teria sido alçado pelos seus pares à categoria de herói como repórter de guerra e as revistas de “people” já lhe teriam dedicado catadupas de capas glamorosas e vasculhado as aventuras da sua intrepidez por esse mundo fora.


Uma campanha revoltante 

Estamos a assistir, pelo contrário, a uma campanha absolutamente inédita contra um jornalista, procurando marcá-lo a ferrete, isolá-lo, desacreditá-lo. Chegam ao ponto de exigir que não comprem trabalhos seus (felizmente, a CNN Portugal resiste às pressões), crendo que o silenciarão pela fome, e não hesitam, consciente e cobardemente, em denunciá-lo e em colocá-lo na ponta de mira dos caçadores ucranianos de repórteres que não sejam do seu agrado.

Tudo isto é absolutamente irresponsável, insano e revoltantemente sacana. Nunca vi na imprensa tamanha demonstração de anti-camaradagem, nunca imaginei que tal fosse possível, nem mesmo nos tempos em que a batalha ideológica nas redacções – ou entre jornalistas – foi realmente viva e intensa.

O Correio da Manhã bate todos aos pontos, tamanha é a persistência, a verrina e a distorção dos factos com que persegue esta presa.

Segundo a edição do passado dia 22, o CM deu-se ao trabalho de ir chatear a CNN Internacional para querer saber a sua reacção “à polémica” sobre o trabalho da CNN Portugal “sobre a guerra da Ucrânia, que tem gerado uma onda de indignação”.

Descrevendo o trabalho do repórter Bruno Amaral de Carvalho diz que este “se refere” ao Batalhão Azov “como ‘neonazi’, tal como as autoridades russas”, forçando assim uma colagem ilegítima de um seu camarada de profissão ao Kremlin.

É espantoso que nada de profissionalmente errado se aponta no CM a Bruno Amaral. Nem mesmo o conhecido crítico de media do jornal, Eduardo Cintra Torres, que dedicou o texto principal da sua página semanal “Panóptico” de domingo ao caso da queixinha tuitada pela diplomata aposentada Ana Gomes.

Sobre Bruno Amaral de Carvalho escreve: “De ‘polémico’, há apenas a referência ao Batalhão Azov como ‘neonazi’, o que o jornalista poderia ter facilmente ultrapassado, se quisesse, bastando atribuir essa qualificação aos russos (ou ao PCP)”.


A desatenção de um especialista

Com a chancela de especialista em media, a imputação da qualificação “aos russos ou ao PCP” poderia ganhar credibilidade. Mas também o perito anda desatento: há anos que jornalistas, jornais e televisões insuspeitos de russofilia ou da sarna do PCP se referem ao Batalhão Azov como força neonazi.

“Azov, o batalhão neonazi que vai defender Mariupol”, titulava um jornal português em 1 de Setembro de 2014. Seria o Avante!? Não, era mesmo o Público.

É também do Público este título, datado de 21 de Junho de 2020: “Ucrânia, o campo de treino militar para a extrema-direita mundial”.

Em 2 de Março de 2018, The Guardian não hesitava em chamar-lhe “notória milícia fascista ucraniana” e neonazi.

“Batalhão Azov, grupo paramilitar neonazista.” É assim que, já em plena guerra (25 de Março), o insuspeito Folha de S. Paulo qualifica a referida força.

“Who are Ukraine’s neo-Nazi Azov Battalion?”, titulava, em 24 de Março, o Independent

Neo-Nazis Azov battalion is Ukraine’s controversial custodian”, titulava o The Economic Times, no passado dia 6.

Se os exemplos não foram suficientes, arranja-se mais, e noutras línguas…

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