Notas de pré-campanha (11)
1. Uma vez sem exemplo, partilho uma confidência. Sempre que falo em público, ou para grupos grandes, uso um truque: nos instantes imediatamente anteriores ao início da intervenção, miro a última fila da sala, perscruto-a como se fosse a linha do horizonte. É, porventura, a expressão física dos nossos limites, embora também possa representar a fronteira que gostaríamos de transpor, para chegarmos a outros muito para além dos que se encontram diante de nós, ou proporcionar a oportunidade para, pequenos que somos, nos reencontrarmos com os outros, o seu contexto e a sua história. Vem isto a propósito do mural pintado na parede do fundo do salão da Associação de Moradores da Bouça, no Porto, comoventemente evocativo de um passado de luta pelo direito à habitação e da singular experiência dos projectos SAAL, desenvolvido com as actividades de cultura e recreio, onde, ao final da tarde de hoje, a CDU fez a apresentação pública dos 45 candidatos pelo distrito do Porto e onde, justamente, apontamos a habitação entre as principais prioridades da candidatura.
2. A
feira semanal de Pedras Rubras, freguesia de Moreira, na Maia, segue com
sossego e pouca clientela. “Não há dinheiro, não há clientes.” Uma vendedora de
legumes engole com dificuldade a resignação. A brigada da CDU diz ao que vai:
melhorar os salários e as pensões e reformas, para melhorar a vida das pessoas.
E ela: “Bem, se fosse assim…” A dobadoira da conversa vai rodando. “Estamos bem
conversados, vai correr-vos bem” – e pisca o olho, com um sorriso. Adiante, outro
feirante dá corda aos seus temores com o avanço de certos perigos (mais além,
outra falará da ameaça de um “novo Hitler”). Socialista de há muitos anos, lá
puxa da pergunta sobre como se pode arranjar uma solução para o PCP e a CDU
terem mais influência. E que tal dar-lhes mais votos? “Ora aí está uma boa hipótese,
há que pensar nisso.”
3. Visita
aos postos do Bom Sucesso de jardineiros e de varredores do Porto. É hora de
almoço para uns e de fim de jornada para outros. A conversa flui. “Se há
esperança de mudar isto? Claro.” Para melhor, que os salários são curtos, pelo
salário mínimo, ou pouco mais. “O que vale é que tive seis pontos na avaliação.”
E a avaliação é justa?
4. São
três da tarde e a fábrica Monteiro e Ribas começa a expedir em pequenas os
trabalhadores de mais um turno. Apesar da pressa para encostarem o cansaço em
casa, aceitam os documentos da CDU. Melhorar os salários, reduzir a jornada de
trabalho, regular o trabalho nocturno e por turnos… “Eu sei que o PCP fez propostas
e está muito bem, mas é pena que os outros não tenham aprovado”, ouvimos de vários,
cada qual na sua vez e na cadência da saída. Então, não é justo dar mais força
à CDU? E outros: “Sim, estamos a lutar por isso, já fizemos plenários!” E
ajudará se tivermos mais deputados? “Claro, vamos a isso!”
5. A
zona central do Carvalhido é uma amostra das angústias que atormentam o povo. “São
muitos idosos por aqui, com reformas baixas, pouco compram…” Ouve-se de um
comerciante, como do seguinte, num rosário de queixas, as lojas vazias e poucos
transeuntes cedendo sequer à tentação de espreitar a montra. “Ó senhor, ganho
400 euros, para que dá isso? E ainda agora veio um aumentozito…” Pois se o PS tivesse
aprovado a proposta do PCP, teria um aumento de pelo menos 70 euros. “Já era
uma grande ajuda, sim senhor. Mas foi assim? Olhe que não ouvi nada na televisão…”
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