Diário Off (8)
Confinamentos coincidentes. A proposta de "abordagem e confinamento específicos" para ciganos manteve-se hoje bem à tona da ordem do dia, no Parlamento e na comunicação social. Na arena parlamentar, o primeiro-ministro procurou aligeirar a sinistra questão, rematando de trivela contra o deputado. O efeito pode não ser o melhor: parece uma frivolidade pré-estival. Mas não é - é demasiado séria para não ser levada a sério, mesmo que me custe dar-lhe corda.
A simples
ideia de um "confinamento específico" seja de que ser humano for, com
a evidente ressonância de execrável eufemismo que remete para a memória do
extermínio de milhões de judeus, ciganos, comunistas e homossexuais nos campos
de concentração e de morte nazis, não pode senão ser encarada com repugnância e
rejeitada com toda a firmeza.
A evocação
do gigantesco genocídio, vergonha da Humanidade, é decerto dura e alguns dirão
que é uma comparação excessiva. Na antevéspera da comemoração dos 75 anos da derrota
do nazi-fascismo, com a assinatura da rendição incondicional da Alemanha nazi,
ocorrida em Berlim ao início da madrugada de 9 de Maio de 1945, é necessário
gritar bem alto que tamanho crime não pode voltar a acontecer.
A contragosto
volto a convocar aqui as perigosas palavras do Ventura, receando estar a
contribuir para a sua visibilidade, porque é bem certo que a personagem parece
sair sempre a ganhar junto da sua tribo (vejam bem as sondagens, que lhe sopram
crescente simpatia e das quais se gabou ainda hoje em pleno hemiciclo da Casa
da Democracia…), por mais ignóbeis que sejam as suas posições.
A
contragosto trago à reflexão o figurão e o que ele representa, também para
alertar para os perigos de certas concessões dos media, senão mesmo da cumplicidade mais ou menos consciente, dos
que encontram em tudo o que possa bulir contra o marasmo informativo justifique
tempo de antena.
Veja-se o
caso do Fórum TSF de hoje, com a pergunta “Apoia a proposta do Chega, ou considera que ela é racista e
inconstitucional?”. O lema do programa é “Sem temas tabu nem verdades
feitas, a TSF desafia os ouvintes a dizerem o que pensam”, mas não faltaram no
espaço público interpelações razoáveis sobre os limites da decência. Que falta
perguntar – se os ouvintes concordam com os campos de concentração? Se apoiam o
restabelecimento da pena de morte? Por aí fora…
Não ouvi o programa nem creio que ele esteja
disponível, mas os inúmeros
comentários de apoio e incentivo ao Ventura, ao Chega e às suas ideias,
assim como as preocupantes expressões de ódio contra a comunidade cigana deixados
no espaço do programa no sítio da TSF em linha são suficientemente inquietantes
para aconselhar toda a vigilância, mas também toda a firmeza.
As coincidências quanto a sinistras confinações
não se ficam por aqui.