O acosso à Rússia e a instável dissuasão nuclear


As notícias de que os Estados Unidos da América poderão autorizar a utilização de sistemas de mísseis de longo alcance pela Ucrânia contra solo russo prenunciam um agravamento sem precedentes da escalada da guerra e a sua internacionalização, pelo menos ao nível regional, e colocam a Europa e o Mundo a um passo de uma tragédia para a Humanidade.

A retórica belicista cada vez mais agressiva de Volodymyr Zelensky e o seu constante apelo ao fornecimento de armas, incluindo engenhos com capacidade de propulsão a grandes distâncias e, por conseguinte, de meios humanos habilitados para os operar que pertencem a forças da NATO, é apenas um elemento instrumental na estratégia internacional de acosso à Federação Russa conduzida pelos EUA e pelos seus aliados.

Nos cenários de catástrofe possíveis, que não excluem uma ampla conflagração, colocam-se sobre a mesa as hipóteses de recurso aos assustadores arsenais nucleares, especialmente se as circunstâncias forçarem Moscovo a opções mais musculadas para as suas operações.

As autoridades russas já verbalizaram em diversas oportunidades a possibilidade de recurso a engenhos nucleares, se vierem a ser forçadas a isso, como ainda ontem o presidente Vladimir Putin tornou claro estar sobre a mesa.    

É certo que qualquer dirigente minimamente consciente e avisado sabe que constituiria uma alteração dramática no curso do conflito, de tal modo radical que poderia degenerar num patamar de uso da força ainda mais drástico, com a utilização de armas nucleares estratégicas.

Segundo a sua última declaração no âmbito do Novo Tratado de Redução das Armas Estratégicas (New START, no acrónimo anglo-saxónico), em 2022, a Rússia possuía 1 549 ogivas estratégicas embarcadas em 540 sistemas de lançamento estratégico, como mísseis balísticos intercontinentais e mísseis balísticos de submarinos e de bombardeiros pesados.

Os Estados Unidos declararam, em 2023, 1 419 ogivas daquela classe, que equipavam 662 sistemas de lançamento. Ambos estavam abaixo do limite de 1 550 estabelecido no New START, assinado por dois em 8 de Abril de 2010.

Além disso, os EUA possuem pelo menos 100 bombas nucleares de gravidade B-16, com capacidade de destruição 24 vezes maiores do que a bomba lançada em 1945 sobre Hirochima, localizadas em seis bases militares da NATO na Europa: Alemanha (Büchel), Bélgica (Kleine Brogel), Holanda (Volkel), Itália (Aviano e Ghedi) e Turquia (Incirlik), segundo precisa a organização norte-americana Arms Control Association, na actualização de julho deste ano.

Com 5 748 bombas, os Estados Unidos e a Federação Russa (5 580) somam mais de 88% do total de 12 825 ogivas (estratégicas e tácticas), entre as retiradas mas ainda não desmanteladas, as que se encontram em armazenamento militar, isto é, para uso potencial, e as que estão preparadas, que se estima existirem no Mundo.

Embora esmagadores, os dois países não detêm o monopólio absoluto. A China possui 500; a França 290; o Reino Unido 225; a Índia 172; o Paquistão 170; Israel 90; e a Coreia do Norte 50. Trata-se de uma distribuição planetária que terá contribuído até agora para a dissuasão e a contenção generalizadas. Mas que papel terá no futuro demasiado próximo e no contexto excessivamente tenso?

Na sua última análise anual à situação dos armamentos, desarmamento e segurança internacional (SIPRI Yearbook 2024), publicada em junho, sobre o Instituto internacional de Estocolmo de Estudos da Paz (SIPRI, na sigla em Inglês) destaca o papel crescente das armas nucleares à medida que se degradam as relações geopolíticas, tendo aumentado o número e os tipos de engenhos, bem como o investimento no desenvolvimento dos sistemas de lançamento.


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