Notas de campanha (2)

1 – Em Vila Boa de Quires, concelho de Marco de Canaveses, resta desde o século XVIII a portentosa frontaria barroca do solar nunca acabado do senhor local de então, ao que consta falido entretanto. Lembrei-me das Obras do Fidalgo, ao escutar o ruidoso e ingovernável debate dos líderes partidários nas quatro rádios “nacionais” e os descaminhos com que sucessivos governos desgraçaram a República e de que a obra inacabada é uma oportuna metáfora. No fundo, “é tudo uma questão de opções”, como costuma dizer o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo.   

2 – “É o único partido que vem cá!” O pedreiro toma com delicadeza nas mãos calosas o panfleto da CDU, assim afagado entre a merenda do curto intervalo. “É preciso ter mais deputados”, diz outro, no telheiro onde começam a rarear os trabalhadores. Nas pedreiras e telheiros em Peroselo e Boelhe, em Penafiel, e em Alpendurada, no Marco de Canaveses, é reconhecido o empenho do PCP e da CDU nas alterações legislativas que permitiram a reforma antecipada a tantos trabalhadores da extracção, corte e transformação da pedra, afectados por doenças esquelético-musculares, a silicose e a “vista picada”.

 3 – “É o partido dos trabalhadores!” À saída de uma fábrica em Constance, uma operária no banco de trás de um automóvel com trabalhadores que acabam o turno reclama um panfleto da CDU. Vai passando o cortejo de outros trabalhadores rumo ao parque de estacionamento. Aumentar os salários, reduzir os horários… “É isso! Isso é que é preciso”, vão replicando. O estribilho repete-se também à saída de outra unidade industrial em Vila Boa de Quires. Uma das operárias solta o desabafo “É o que é preciso, não tive nada e já passou um ano”. O PCP bem propôs, mas os outros chumbaram. “Pois então mudem lá isso…”

4 – Num café em Tuías, um velhote larga a provocação amarga “Não quero saber de política!” e rejeita o desdobrável de campanha. Na mesa ao lado, outro toma o papel e comenta com serenidade: “O país precisa de mais esquerda; não sou comunista, mas o PCP faz falta. Para os salários, para se compensar quem trabalha por turnos, não é o patrão ficar com o lucro todo…”    

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