A simplificação absoluta do poder do patronado
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É urgente não perder de vista a defesa dos direitos dos trabalhadores e o reforço das suas organizações |
A presente pandemia de Covid-19 pôs muito
bem à vista o quanto o Governo PS agasalha de forma muito cuidadosa os
interesses do capital e do patronato, deixando bem a descoberto direitos dos trabalhadores
e das suas organizações representativas.
A pretexto da emergência e da necessidade
de medidas urgentes de apoio às empresas, as comissões sindicais e trabalhadores
estão impedidas, na realidade, de obter informação rigorosa, de discutir e de contrapor
às medidas de suspensão ou redução do horário normal de trabalho em largos
milhares de empresas.
O chamado regime do “lay-off simplificado” demonstra-o bem, ao simplificar
absolutamente, e em prejuízo exclusivo dos trabalhadores, preterindo de facto as
importantes formalidades impostas pelo Código do Trabalho (artigos 299.º e 300.º)
e banalizando, sem qualquer escrutínio, o que deveria ser excepção.
Onde o Código do Trabalho determina que o
empregador às organizações representativas dos trabalhadores (ORT) a intenção
de reduzir ou suspender a prestação do trabalho, vêm a Portaria n.º
71-A/2020, de 15 de Março (Art.º 5.º) e o Decreto-Lei
n.º 10-G/2020, de 26 de Março (Art.º 4.º) queimar etapas e determinar que o
empregador comunica a decisão aos trabalhadores, “ouvidos os delegados
sindicais e/ou a comissão de trabalhadores”.
Onde o Código manda o empregador informar
previamente as ORT sobre os fundamentos económicos, financeiros ou técnicos e
os critérios de selecção dos trabalhadores a abranger, entre outros elementos,
abrindo-se depois uma fase de informações complementares e de negociações, com
vista a um acordo, reduzindo a acta as matérias objecto de acordo ou controvertidas,
vem a legislação atamancar os procedimentos, desprotegendo os trabalhadores sem
apelo nem agravo.
Bem dizem a portaria e o decreto-lei
referidos que a empresa se limita a informar os trabalhadores de que vão ficar
em lay-off, “ouvindo” as ORT. Mas em
que momento? Com que prazos mínimos? Com que conteúdo e consequências da “audição”?
Bem dizem aqueles diplomas que os
delegados sindicais são “ouvidos”, quanto mais não seja para cumprir a
formalidadezinha, porque informações a sério e negociação séria é requisito que
o vírus arreda lá para as Calendas.
É aliás sintomático que nenhum dos
diplomas determine a obrigação de juntar ao pedido de apoio à Segurança Social
a acta da reunião de “audição” das ORT…
É com estas e com outras que o Governo, simplificando
a vidinha ao patronato, vai reduzido e neutralizando direitos aos trabalhadores,
ao mesmo tempo que, suspendendo ou retirando competências às suas organizações
e representantes, os enfraquece.
A presente crise é um drama de saúde pública,
que afecta largas dezenas ou centenas de milhares de trabalhadores, em termos
de saúde e dos rendimentos no plano imediato, o que justifica o medo, hesitações e recuos.
Mas também ameaça de desestruturação da
resistência e da luta, se os trabalhadores não forem capazes de vencer o pavor
e de reerguer as suas organizações, especialmente nas empresas.