Ucrânia: A inquestionada suspensão de partidos da oposição
O anúncio foi acolhido com uma quase
indiferença, sem que se conheça qualquer comoção mediática – nem noticiosa nem no
plano dos comentários – ao nível dos media dominantes, ou dos governos europeus
perante tamanho ataque às liberdades políticas dos ucranianos e aos princípios
basilares da ordem constitucional democrática.
Os efeitos da decisão, atribuída por
Zelensky ao Conselho Nacional de Defesa e Segurança, produzem-se durante a
vigência da lei marcial, decretada em 24 de Fevereiro e prorrogada ontem por
mais 30 dias, mas nada garanta que não se tornem definitivos.
Entre as formações atingidas estão
a coligação Plataforma de Oposição – Pela Vida, o Partido Sharia, o Nosso, a
Oposição de Esquerda, a União de Forças de Esquerda, Estado, Partido Socialista
Progressista da Ucrânia, Socialistas e Bloco.
A imprensa dominante e a elite
editorial acataram acriticamente a notícia, não se conhecendo qualquer
questionamento sobre a legitimidade da decisão, sendo raros os órgãos de
informação que, mesmo de forma apressada e superficial, referiram a reação de
visados.
O britânico “The Guardian”, por exemplo, alude de forma genérica à reação limitando-se a indicar que fontes oficiais dos partidos disseram que a suspensão não tem base legal.
De um modo geral, os media,
embora identifiquem os partidos e coligações abrangidas pela decisão, omitem
que estão incluídas forças de esquerda e dispensam-se de qualquer enquadramento
designadamente quanto aos respectivos posicionamentos sobre as mais diversas
matérias de política ucraniana, incluindo quanto à invasão russa.
Por outro lado, não encontrei qualquer sobressalto pela circunstância de entre os visados se encontrarem partidos e formações com representação parlamentar (A Plataforma de Oposição – Pela Vida tem 43 deputados), o que só por si seria mais que suficiente para denunciar o ataque à essência da democracia que os governos ocidentais tanto se afadigam fazer crer que a Ucrânia é.
O silêncio cúmplice que se abate agora sobre este novo ataque é da mesma natureza da omissão e indiferença com que os media e a “comunidade internacional” encaram, desde o verão de 2015, a chamada “lei da descomunização” que, no rescaldo do golpe de Estado de 2014, baniu o Partido Comunista da Ucrânia, impedindo-o de participar nas eleições de 2015 e de 2019, mantendo-o ainda hoje fora da actividade “legal”.