Os jornais também caem na esparrela...


Ainda sobre a questão da centralidade do Chega nos media e a forma como estes se deixam capturar pela sua agenda, é justo salientar que não foram apenas os telejornais da noite de ontem que caíram na esparrela, noticiando de forma incompleta e enviesada a rejeição de várias iniciativas legislativas sobre remunerações de profissionais de polícia (ver “post” anterior).

Nos diários de hoje, há dois casos merecedor de reparo e um digno de nota distintiva:  

Em chamada de primeira página, o Correio da Manhã destaca “Suplementos de polícias / Parlamento chumba proposta do Chega”. Na peça principal, o antetítulo prossegue na mesma linha: “Chumbo / PSD, PS e CDS votaram contra proposta do Chega”, etc.

A entrada do texto “legitima” tal tese, ao referir a “decisão dos partidos representados na Assembleia da República que chumbaram o projecto-lei do Chega” e sem fazer uma única referência aos projectos de outros partidos (PCP e PAN), aliás também rejeitados.

Na peça secundária, o CM reforça-a: “O debate deixou perceber que todos os partidos defendem os policias, mas nenhum quer aprovar iniciativas do Chega – a excepção, curiosamente, foi o Bloco de Esquerda e o PAN – mesmo que em benefício das forças de segurança” (A questão da opinião misturada com notícia é apenas um pormenor…).

O Diário de Notícias afina pelo mesmo diapasão. “PS alia-se a PSD e CDS e trava propostas do Chega”, titula no interior do jornal. E logo reforça, no pós-título, que “Um bloco central que votou contra Ventura”.

Apesar de referir no lead que foram três partidos (CH, PCP e PAN) a apresentar projectos, o DN menciona os desaguisados que atrasaram a intervenção do deputado comunista António Filipe, mas não o cita uma única vez, nem na peça principal, nem no rodapé de “discursos directos”.

A nota distintiva vai para o jornal Público, cuja enigmática chamada de primeira página – “Parlamento / Protesto de moedas de 1 cêntimo dos polícias foi travado” – remete para os “incidentes” e atrasos na entrada dos profissionais de forças e serviços de segurança que foram encher as galerias do Parlamento, na sequência dos apelos do Chega.

A reportagem mostra que os jornalistas do Público foram procurar explicações (é para isso que o jornalismo serve, não é verdade?) para o atraso no acesso dos polícias às galerias, que motivara repetidas interpelações do CH à Mesa da Assembleia, chegando mesmo a sugerir que os trabalhos fossem suspensos enquanto não entrassem todos (seriam uns 400 ou 500).

O que se passava, afinal? Se não eram todos, eram muitos os que levavam moedas de um cêntimo nos bolsos, em protesto (o primeiro-ministro dissera que não lhes dará “nem mais um cêntimo!”), que evidentemente fizeram “apitar” os detectores de metais no controlo de segurança no acesso ao edifício e obrigaram a refiná-lo.

Está explicado e as conjecturas ficam por nossa conta...

Já gora, o jornal refere todos os projectos.

 

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