O "apelo" indevido do Presidente da República

O presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, fez muito bem em advertir certo líder partidário e deputado à AR para o respeito devido por todos para com os muitos milhares de cidadãos estrangeiros que residem no nosso país e contribuem para o seu desenvolvimento.

São muitas e, nalguns casos, inultrapassáveis as divergências que tenho em relação aos seus posicionamentos, mas mereceu os justos aplausos com que, espontaneamente, a maioria dos parlamentares o saudou.

O presidente da Assembleia da República não poderia deixar de interpretar o comando constitucional e o consenso democrático em relação ao acolhimento dos imigrantes, nem deixar de agir como agiu.

Não sei se o Presidente da República fez bem – ou se poderia recusar… – em receber o dito líder, que lhe foi fazer queixinhas e que, no final d audiência, não se coibiu de “desafiar” Marcelo Rebelo de Sousa a “assumir que foi receptivo” aos seus argumentos.

Mas estou certo de que, apesar de declarar que não quer pronunciar-se sobre a vida de outros órgãos de soberania, o Presidente da República fez muito mal em apelar “à aproximação das posições entre as duas partes”.

Esse “apelo” releva de um profundo e perigoso equívoco: não há um conflito entre duas partes; há um claro isolamento parlamentar de tal partido e do seu líder designadamente pelo seu comportamento obscenamente xenófobo e racista.

E tem uma consequência grave: ao proclamar como "parte" a dita personagem, Marcelo normaliza o seu comportamento.  

Mas também estou certo de que, com estas e com outras, o figurão vai-se multiplicando no espaço público e capitalizando entre os seus apoiantes. É também assim que o ascenso do fascismo se faz. 

(Foto copiada, com a devida vénia, do sítio oficial da Assembleia da República) 

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