Covid: quem não quer ser autoritário não lhe veste a pele
Diz o senhor primeiro-ministro que não quer ser autoritário,
mas que fará tudo para combater a pandemia de covid-19. Pois eu apreciaria
muito que não insistisse em tentar violar direitos fundamentais dos cidadãos em
vez de investir mais no Serviço Nacional de Saúde e em medidas efectivamente
preventivas da transmissão do coronavírus responsável.
Vem isto a propósito da Proposta
de Lei n.º 62/XIV, ontem entregue na Assembleia da República e hoje admitida,
na qual o Governo quer impor aos cidadãos, sob pena de multa pesada, a
utilização obrigatória “no contexto laboral ou equiparado”, da aplicação “STAYAWAY
COVID”.
Até agora, a utilização da referida aplicação é de carácter
voluntário e, mesmo assim, muitos cidadãos têm reservas, devido à devassa desproporcionada
da sua privacidade, com o registo e rastreio de deslocações, contactos (“proximidade”)
com outras pessoas, etc., sem garantias de que não haverá uso abusivo de tais
informações.
A própria Comissão Nacional de Protecção de Dados chamou, em
tempo bem útil, a atenção para tais riscos, mesmo que adesão seja voluntária,
salientando que só poderia mesmo ser voluntária.
Impor a utilização da aplicação a quem tenha telemóvel que o
permita (vulgo “smartphone” e atribuir a fiscalização à GNR, à PSP, à Polícia
Marítima e até – pasme-se! – às polícias municipais é um passo inaceitável e
muito perigoso que faz temer ainda mais as consequências compressoras de
direitos, liberdade e garantias das medidas “justificadas” por esta “emergência”.
A situação sanitária não justifica tudo. E não podemos
esquecer que muitas medidas más tiveram boas justificações.