PCP: "100 anos, 100 acções" em cinco notas
Escreveram-se hoje
tantas e tão belas palavras sobre o 100.º aniversário da fundação do Partido Comunista
Português (PCP), que é quase atrevimento vir juntar estas cinco pretensiosas notas
pessoais acerca do modo como observei o dia.
Primeira – Bandeiras rubras
floresceram nesta madrugada nas avenidas, ruas e praças – na cidade capital,
nas cidades e vilas – e creio que aldeias também – que são nervo, energia e
sangue do país. É tão exaltante e tão belo! E que força, que determinação
mostram!
Segunda – “100 anos, 100
acções”. Mas foram mais, muitas mais, cada uma com seu objectivo, com seu
contexto, com as suas memórias e com os seus heróis. Veja-se o caso da Maia.
Ainda o PCP dava os
primeiros passos, em 1924/25 e já havia em Águas Santas uma célula que elegeu
um delegado ao II Congresso do Partido, em 1926. Em 1932, já em plena ilegalização do PCP, foi preso pela primeira vez o camarada Elísio
Francisco Ferreira, eleito para a Associação dos Manipuladores de Pão do Porto,
outras prisões outras somas de sevícias se seguiram em1936 e em 1942.
Entre as muitas lutas, regista-se, em 1937, a greve das operárias da
Fábrica Oliveiras, na Areosa, em solidariedade com colegas despedidas; a recusa
de receber o salário com descontos indevidos dos trabalhadores da Industria
Nacional de Produtos Químicos, em Moreira, em 1944. Também nesse ano, em plena
II Grande Guerra, a população de Barreiros, tocou o sino a rebate e concentrou-se
junto do Grémio, exigindo Pão.
Isto contou, comovendo, a camarada Teresa Lopes, dirigente da DORP, e
resistente antifascista que viveu na clandestinidade.
Terceira – Os telejornais das 20 horas ignoraram o país engalanado de bandeiras rubras e praticamente não referiram o carácter nacional e descentralizado da iniciativa “100 anos, 100 ações”, trataram o acontecimento – um partido que faz 100 anos, pá! – como coisa pouco mais que trivial, uma efeméride quase irrelevante, muito focada no tópico da relação com o PS/Governo.
Só a TVI desenvolveu mais o tema, sendo a única a mostrar a presença
expressiva e a vitalidade da Juventude Comunista Portuguesa na concentração de
Lisboa, acrescentando elementos de reportagem no Couço e com o
secretário-geral, cruzando-os com pontos de vista de historiadores.
A RTP1 teve o “privilégio” do secretário-geral em estúdio, mas mais interessada
em encostá-lo à parede com a constatação
do declínio em número de deputados, de eleitos autárquicos e de votos e em
imputar ao PCP “cumplicidade” (sim, foi assim que disse o pivô, José Rodrigues
dos Santos) com as cativações e outras medidas do Governo, do que em
compreender os fenómenos sociais, económicos e políticos que ajudam a explicá-lo
e em destrinçar as posições e responsabilidades do PCP das responsabilidades do
PS.
Quarta – A forma como os media
cobrem a vida do PCP demonstra a profunda desigualdade de armas na real batalha
ideológica de que os meios de informação dominante são instrumento muito
poderoso. Mas talvez nem tudo esteja perdido: é impressionante a partilha de
imagens e de textos nas redes sociais, relativas a iniciativas por todo o país, feita por organizações e militantes do PCP, mostrando como é possível furar o cerco de silêncio e os truques do
preconceito.
Quinta – Por fim, revisito as páginas de uma magnífica obra sobre o
centenário do PCP, “100 Anos de Luta”, e é inevitável deter-me nas que evocam as
provações e os sacrifícios, hoje inimagináveis para muitos, de tantos e tantos
militantes que enfrentaram a brutalidade da repressão fascista, as
perseguições, as torturas, o cárcere e a morte. E curvo-me perante os nomes dos
mártires de outrora, para que pudéssemos ter futuro.