Campanha eleitoral e direito à informação

Suponho que é oportuno, e talvez seja uma contribuição útil para a discussão, perigosamente apressada, das regras sobre a cobertura de campanhas eleitorais, recordar aqui o teor do comunicado que a Direcção do Sindicato dos Jornalistas publicou em 10 de Setembro de 2013:

Comunicado

Informação sobre campanha eleitoral é direito dos cidadãos

1. A Direcção do Sindicato dos Jornalistas tomou conhecimento, com profunda preocupação, da anunciada decisão das direcções de informação de operadores de televisão – e especialmente da RTP – de não assegurar a cobertura da campanha eleitoral autárquica, limitando-a ao acompanhamento dos líderes dos principais partidos e a reportagens sobre municípios que considerem relevantes.

2. Trata-se de uma decisão grave, por pôr em causa um direito fundamental, que pertence aos cidadãos e não é propriedade privada dos jornalistas ou dos órgãos de comunicação social – o direito à informação. 
3. Resumir a cobertura jornalística à mera presença dos líderes partidários, pelos vistos apenas para recolha de declarações sobre temas nacionais, ocultando o contexto da deslocação e omitindo toda a informação sobre as candidaturas, os projectos e as discussões locais representa uma demissão inaceitável do dever de informar. Quem sai a perder são os cidadãos. E quem assim proceder não ganha em credibilidade.
4. As eleições autárquicas e a campanha que as antecede constituem momentos de elevado significado cívico e político com decisivas consequências na vida das populações. Ocultar propostas e candidaturas e silenciar ideias e debates é um mau serviço à Democracia e uma renúncia grave a uma função primordial da comunicação social livre: divulgar ideias e projectos e promover a discussão plural.
5. O SJ tem plena consciência de que não é possível, mesmo aos órgãos de informação de maior dimensão, assegurar a cobertura integral da campanha em todos os 308 municípios. Assim como sabe que os meios técnicos e humanos à disposição, nomeadamente dos operadores de televisão, não são infinitos. Mas reitera que têm o dever de assegurar o melhor possível, no conjunto de circunscrições o mais amplo possível e com o maior pluralismo possível a efectiva cobertura da campanha eleitoral. 
6. Quando a lei das eleições autárquicas (Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto) determina que “os órgãos de comunicação social que façam a cobertura da campanha eleitoral devem dar um tratamento jornalístico não discriminatório às diversas candidaturas” (Art.º 49.º, n.º 1), não quer dizer que todas elas tenham de ser cobertas de forma sistemática e simultânea. E muito menos que a lei suspenda a autonomia editorial das redacções.
7. Cabe aos responsáveis editoriais adoptar estratégias adequadas aos meios disponíveis, e mediante critérios jornalísticos rigorosos e não discriminatórios, de forma a garantir que os cidadãos vão conhecendo o melhor possível as iniciativas e propostas de cada candidatura.
8. Se subsistirem receios quanto à eventualidade de decisões adversas da Comissão Nacional de Eleições ou dos tribunais, há que enfrentar essa contingência como um risco natural para os jornalistas e para os órgãos de informação. As divergências de interpretação da lei são uma consequência justa do Estado de Direito Democrático.
9. Finalmente, a Direcção do SJ apela à reflexão interna, nas redacções, sobre o modo, as condições e as opções na cobertura de campanhas eleitorais. São recorrentes as queixas relativas a discriminações e exclusões. Não se propõe um jornalismo burocratizado, mas um Jornalismo que quer informar e esclarecer a ampla diversidade do público e atender à realidade plural. 
10. Convém que não nos apressemos a reclamar alterações legislativas, porque talvez o problema de fundo não seja jurídico. O que pertence ao domínio da liberdade de informação e do respeito pelos direitos dos cidadãos pode bem ser entregue ao poder editorial dos jornalistas. Antes que, em nome de boas razões, nos imponham más normas...

Lisboa, 10 de Setembro de 2013
A Direcção
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