No 40.º aniversário do NDMALO-GE


Texto da apresentação no encerramento das comemorações do 40.º Aniversário do NDMALO – Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro – Grupo Ecológico, realizada hoje no salão nobre da ex-Junta de Freguesia de Massarelos, no Porto: 

1. Saudação e agradecimento 

Começo por agradecer o amável convite para fazer esta modesta apresentação, comemorativa do 40.º aniversário do Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro – Grupo Ecológico, cuja existência a cidade do Porto, através do respectivo órgão deliberativo – a Assembleia Municipal – saudou com inteira justiça, em moção aprovada por unanimidade na sessão do passado dia 12. 

Com efeito, nessa moção, proposta pelo Grupo Municipal da CDU mas apoiada pelas demais bancadas, salienta-se o inestimável serviço prestado pelo NDMALO desde o início da sua já longa existência, especialmente a persistente intervenção nos processos de discussão pública dos instrumentos de planeamento e gestão urbanística e nas inúmeras causas que abraçou – da defesa dos cursos de água à defesa do património edificado, passando pela preservação dos espaços verdes e pela consciência ecológica. 

Numa altura em que os inquéritos de opinião continuam a testemunhar o interesse dos cidadãos pelas causas do ambiente, é justo homenagear uma das já mais antigas associações portuguesas e é indispensável agradecer a resistência dos seus membros e dirigentes, desejando longa vida a este Grupo Ecológico. 


2. Um grupo da cidade para o mundo 

Quem percorre a singela exposição sobre a história e a vida do NDMALO patente nesta sala pode encontrar a evocação de momentos centrais da sua longa actividade, cuja riqueza se estende muito para além da fronteira que a sua denominação parece conter. 

De facto, esta organização que assume como geografia formal a freguesia de Lordelo do Ouro – aliás em má hora agregada a outra freguesia numa reforma administrativa sem sentido e ditada por economicismo demagógico – nunca foi, nem poderia ser, uma associação circunscrita aos limites da sua localização. 

O NDMALO, com este acrónimo, que me habituei a ler, a pronunciar e a escrever há tantos anos, é, pela sua própria natureza – de Grupo Ecológico, como assim se designa no prolongamento da denominação e na acção concreta no terreno – um espaço de intervenção fundado na defesa dos valores e das causas da cidade que lhe foi berço, da região e do país que lhe reclamaram a sua contribuição, e mesmo da universalidade de uma consciência ecológica que já então pulsava com vigor e generosidade. 

Embora sem possuir os meios e os recursos indispensáveis para projectar-se, mantendo as mesmas dificuldades que o meu camarada Jorge Vilas assinalava numa importante reportagem publicada no JN há mais de 38 anos, em Agosto de 1980 (“A coragem de lutar sem auxílios”), o NDMALO-GE é, como podemos testemunhar muitos de nós, um espaço de afirmação muito concreta, com trabalho persistente, corajoso e militante, da consciência crítica de cidadãos organizados que não se demitem da responsabilidade de exigir uma cidade e um mundo melhor. 

Sem cair no panegírico fácil – que é aliás sempre agradável na circunstância de uma efeméride – é justo afirmar que, provavelmente, sem este grupo ecológico cuja visão e cujas convicções, insista-se, transcendem as fronteiras desenhadas pelo Rio Douro e pela Estrada Exterior da Circunvalação, o Porto não teria registado avanços importantes na qualidade de vida e na conservação de espaços verdes como os que verificou. 

Quando hoje frequentamos a Mata da Pasteleira, não podemos esquecer a extraordinária, persistente e exemplarmente empenhada campanha que o NDMALO empreendeu e transformou em causa da cidade, contribuindo de forma decisiva para que todo aquele espaço que, durante décadas, esteve coalhado por barracas e miséria, fosse reabilitado, para que as pessoas que ali viviam alcançassem casas dignas e para que fosse entregue à cidade, para fruição plena e gratificante de um parque urbano. 

Quando percorremos a memória, não podemos deixar de valorizar a voz tantas vezes solitária mas determinada do NDMALO na defesa, entre outros exemplos exaltantes, da Quinta de Riba de Ave, dando uma contribuição muito importante para o que veio a ser a Fundação e o Parque de Serralves, que é hoje um lugar colectivo já verdadeiramente universal, elogio vivo da conservação em ambiente urbano, de arte e de cultura. 

Seria, de resto, da mais elementar justiça um reconhecimento público pela própria Fundação de Serralves do papel que este grupo desempenhou para que esta instituição viesse a ser o que é e para que aquele património não ficasse soterrado debaixo de mais uma urbanização. 

Quando observamos os progressos, apesar de tudo alcançados, em domínios como o Património, a gestão dos resíduos urbanos e as linhas de água, com a denúncia de projectos comprometendo a igreja de Lordelo do Ouro, a poluição de cursos como a Ribeira da Granja (a menina dos olhos do NDMALO e do seu veterano Belmiro Cunha, ou as chocantes montureiras de lixo que manchavam a paisagem da cidade, não podemos senão prestar a homenagem devida a quem, a despeito de obstáculos e até incompreensões, foi voz e consciência de anseios e propostas justos. 

Quando nos recordamos das iniciativas do NDMALO como a Festa da Água ou o Dia da Floresta, a difusão de informação sobre energias renováveis, a defesa das linhas de água, a participação activa e empenhada deste modesto Grupo Ecológico de Lordelo do Ouro nas iniciativas internacionais de combate contra o protocolo luso-espanhol que permitiria a exploração de centrais nucleares na região fronteiriça (finais da década de 1970 e inícios da década de 1980) e a instalação de um depósito experimental de resíduos nucleares de alta actividade em Aldeadavila de la Ribera (1987), não podemos deixar de manifestar o maior apreço por este punhado de forças aparentemente tão frágeis que foram somar firmeza e justeza a causas mais amplas. 

Quando nos recordamos do questionamento e da participação militantes do NDMALO nas discussões do Plano Director Municipal, ou dos planos para o Parque da Cidade e outros instrumentos de gestão urbanística, assim como da atenção muito aguda que empregou na vigilância de atentados na freguesia e na cidade que são suas, não podemos deixar de expressar justa gratidão pelo que este grupo foi, tantas vezes, de olhos, ouvidos, inteligência, consciência e voz da Cidade, interpretando o seu sentir colectivo. 


3. O NDMALO e a imprensa – uma reflexão necessária 

A modesta exposição que cinge o espaço deste nosso encontro representa um pequeno mostruário do repositório vasto – mas hoje desconhecido por muitos – do que foi a consciência crítica dos cidadãos em acção ao longo destes 40 anos de vida do NDMALO e que nós, jornalistas – eu pecador me confesso –, tendemos a sepultar no silêncio. 

Numa altura em que precisamente se discute, mais uma vez e na emergência de uma crise da Imprensa que ameaça a sobrevivência do próprio Jornalismo, não há como descer ao país real, tomar o pulso à vida das organizações e reflectir sobre como a intervenção, a acção, os êxitos e as dificuldades das organizações e do movimento associativo em geral estão, afinal, muito ligados à saúde da Comunicação Social e ao equilíbrio que este ecossistema cívico reclama com urgência. 

Ao fazer um balanço da actividade de uma associação da cidade, hoje com as dificuldades crónicas mas ignorada pelos media e pelos jornalistas, será talvez útil ponderar se o ocultamento das actividades, iniciativas, opiniões e propostas do movimento associativo em geral tem ou não uma relação muito directa – e eu permito-me dizer dramática – com o declínio e até o desaparecimento nomeadamente das publicações periódicas aqui sediadas. 

Basta revisitar os recortes de imprensa relativos às actividades, propostas e intervenções do NDMALO patentes nesta exposição, fazendo-nos recuar aos tempos em que os jornais não regateavam espaço às associações da cidade, para nos aventurarmos na hipótese – que eu creio válida – de, nesse tempo, a Imprensa dever muito da sua vitalidade à vida e ao pulsar do movimento associativo. 

Não trago esta reflexão como um desabafo de circunstância e muito menos para ser agradável ao NDMALO e demais associações ambientalistas, às colectividades de cultura, recreio e desporto e ao movimento associativo popular. Trago-a sobretudo como um desafio, para que exijam à Imprensa o lugar e o espaço que são vossos por direito próprio. 

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